terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Uma das muitas Marias

Domingo, 8 de fevereiro. Entro no busão da Guanabara extremamente chateada porque não consegui comprar passagem pra João Pessoa no ônibus da noite, o que significava que iria “perder” o dia inteiro sentada num ônibus sem fazer nada de proveitoso... Então pego meu estoque de mp3 e coloco ao ouvido, sento na cadeira do corredor (número 6), encontro algumas pessoas conhecidas, cumprimento todas e recolho a minha insignificância.
Ao meu lado ia uma senhora magra de aproximadamente 45 anos que estava sentada na cadeira da janela. Ela entrou acompanhada pela filha de mais ou menos 18 anos e o seu esposo que se despediram com lágrimas nos olhos. Até ai normal, pois podia ser ela estivesse se preparando para fazer uma viagem longa... O busão dá partido e tento colocar meu plano de dormir a viagem toda em prática... Entretanto algo sai errado... [Agora sinto que tudo saiu certo...].
Depois de uma luta interminável para achar uma posição relativamente confortável noto que a senhora do meu lado estava chorando copiosamente. Meio sem saber o que fazer, retiro os fones do ouvido e seguro a mão dela sem entender nada e digo que não precisa chorar, pois tudo iria dar certo.
Assustada, pergunto se ela precisa de alguma coisa, ela então responde que não e continua chorando. [Nessas horas nunca sei exatamente como agir]. Só então percebi que a senhora ao meu lado não possuía nenhum fio de cabelo pelo corpo o que no meu “quengão” significava que ela estava fazendo quimioterapia... Então penso: - Isso explica porque ela tá chorando...
A partir desse momento fazemos um pacto secreto, ela conversar sobre qualquer assunto e eu prometi dar toda atenção e escutar tudo...
Ela então começa a falar dos filhos – duas meninas que moram com ela e um menino que mora numa cidade perto de Cajazeiras e que estava fazendo faculdade -, da vida de casado – o marido dela era muito companheiro e atencioso -, do trabalho – ela vendia sorvete na rodoviária havia mais de 10 anos e conseguiu criar todos os filhos com a graninha que conseguia com a venda dos sorvetes... etc e tal...
Entretanto, ela não tocou em nenhum momento na sua real preocupação (Será que ela conseguirá ter forças para vencer aquela batalha? Fico me perguntando...). Acho até que nem era preciso falar sobre, pois quem já acompanhou algum caso de câncer sabe exatamente como essa doença é dolorosa e maltrata não só a vítima mais toda a família.

Uma pausa na História...

Sempre tive uma relação muito próxima com a MPB e logo que ela começou a contar a sua história, lembrei de três músicas: Encontros e despedidas; Drão e Maria, Maria. Aparentemente músicas completamente diferentes, mas que trazem nas suas melodias e letras esperança... Em especial essas frases marcaram aquele momento
“Mande notícias/Do mundo de lá/Diz quem fica/Me dê um abraço/Venha me apertar/Tô chegando...” “Drão não pense na separação/Não despedace o coração/O verdadeiro amor é vão/Entende-se infinito (...) Drão os meninos são todos sãos”.
No entanto, essa música e letra de Milton Nascimento não pode ser mais pertinente para a situação toda que ela [Drão a partir de agora] está vivenciando... (passamos muito tempo conversando e não nos apresentamos, talvez porque estávamos tão absorvidas pelo momento que o que menos importava naquela hora eram nomes...)

Maria, Maria
Composição: (M. Nascimento/F. Brant)
Maria, Maria
É um dom, uma certa magia,
Uma força que nos alerta
Uma mulher que merece viver e amar
Como outra qualquer do planeta
Maria, Maria
É o som, é a cor, é o suor
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que ri quando deve chorar
E não vive, apenas agüenta
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida
Acho que não é necessário explicar, ou falar nada sobre essa música e o significado, pois ela fala por si...

Voltando a história...

Quando já estávamos chegando ao destino da nossa viagem, eis que o ônibus quebra. Como a minha bagagem era de mão o motorista me colocou em outro ônibus que vinha passando na estrada então nos despedimos. Antes, porém perguntei quando ela voltaria pra Cajazeiras – antes do carnaval porque o filho vem passar com ela – só então saberei como foram as coisas na capital da província...
Quando cheguei em casa fiquei refletindo sobre tudo o que aconteceu desde o momento que subi no ônibus sem nenhuma perspectiva até o momento que me separei de Drão... E foi impressionante perceber como Deus é maravilhoso colocando aquele ser na minha vida que tanto me ensinou... Espero continuar essa história depois do carnaval quando tentarei entrar em contato com Drão e socializar notícias boas...

Beijo carinho em todos.

PS: Gostaria de pedir a todos que mandei boas energias para Drão.

Um comentário:

Sueli disse...

Está aí uma situação que eu também não sei muito bem como lidar. Mas, acho que você se saiu muito bem, aliviou aqueles momentos da viagem dela, pois, se não fosse você, ela teria todas aquelas horas para ficar pensando no problema (seja ele qual for), apenas. Bem, ma se você se encontrar com ela novamente e sua suspeita se confirmar quanto ao câncer, peça a ela para perdoar alguém (até mesmo a si própria se for o caso). Não existe remédio melhor que esse, principalmente para essa doença. Beijo grande!